quarta-feira, 13 de novembro de 2013


RETOMANDO OUTROS CAMINHOS

Vamos voltar ao século XIX para retornar os caminhos que têm procurado interpretar a história das línguas:

  • A DIALETOLOGIA
É o estudo da língua através de uma  perspectivas geográfica, deriva do DIALETO que é uma variedade linguística falada em um determinado dimensão geográfica, mais recente terminologia VARIAÇÃO DIATÓPICA.

Cada ponto de um determinado lugar possuem experiências sociais, históricas, culturais diferenciadas e isso repercute na sua linguagem.

A dialetologia contribuiu para importantes estudos linguísticos em geral e para o estudo da história das línguas em particular. Os estudos históricos começam assim a consolidar a idéia de que a constante heterogeneidade da realidade linguística e de que o contacto entre as diferentes realidades são fatores essenciais para a dinâmica da mudança linguística.

  • A SOCIOLINGUÍSTICA
É o estudo das relações entre as diferentes formas de dizer a mesma coisa e determinados fatores sociais: renda, escolaridade, sexo, etnia dos falantes, etc. Ela propõe o estudo diacrônico e sincrônico em levantamentos dialetológicos e também o estudo global da estrutura sociolinguística.
 

CONCLUINDO NOSSA VIAGEM HISTÓRICA


 "Percorremos, em poucas linhas neste blog,  200 anos de investigação científica, porém deve ter ficado claro que não existe uma teoria suficientemente abrangente que ofereça um tratamento unificado para a complexa questão da história das línguas. Temos diferentes orientações teóricas e muito material empírico".

Kallíana Cruz
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 5: História da nossa disciplina

A história da nossa disciplina III

Noam Chomsky (1927- ) pai do gerativismo
       A linguística gerativista rompeu com a linguística como era praticada, de forma hegemônica. Para ele, o fato empírico central para os linguistas é a aquisição da linguagem pelas crianças que dispõem de um conhecimento inato que as orienta no processo de aquisição da língua. Para o linguista, a tarefa básica é criar um modelo do mecanismo inato, chamada tecnicamente de "gramática universal".
      No caso da diacronia, sendo a gramática vista como um sistema de regras, as mudanças alteraram as regras da gramática, eliminando algumas e introduzindo novas, reordenando sua aplicação.
      No final da década de 1970, abandonou seu modelo de gramática e adotou um novo modelo, inclusive introduziu a ideia de que a GU restringe as gramáticas possíveis, mas admite caminhos alternativos.
     Assim, a linguística gerativista retoma a perspectiva, já antiga em linguística, de abordar as línguas humanas tipologicamente: mesmo que cada língua fixe os parâmetros variáveis da GU de formas diferentes, há coincidências na fixação de determinados parâmetros, reunindo as línguas por esses critérios em subconjuntos que partilham características comuns.
    Com as alterações, houve grande repercussão nos estudos diacrônicos. Assumindo a noção de parâmetro variável, aproxima suas análises diacrônicas aos estudos tipológicos, de grande interesse para os linguistas desde o século XIX.

Análises tipológicas

     Realizar classificações das línguas humanas é trabalhar com tipologias. As línguas são reunidas em famílias e subfamílias ou grupos e subgrupos, pelos linguistas. As primeiras propostas sobre a possibilidade de agrupar as línguas por critérios estruturais foram feitas no século XIX por A.W. Schlegel em 1818 e mais tarde por Schleicher, em 1856. Formavam como critério características da organização morfológica das línguas.
      Outros linguistas do século XX, buscaram elaborar classificações mais minuciosas como Sapir em seu livro "A linguagem" e Joseph Greenberg (1915-2001), linguista norte-americano. Esses estudos contribuem pois trazem dados de diferentes línguas, o que constitui uma contribuição sempre positiva para qualquer disciplina científica pois, o material empírico é parte essencial do trabalho da ciência.
      
      O gerativismo trouxe para a análise diacrônica um refinamento metodológico mais preciso e mais elegante que os tradicionais. Trouxe também um certo rigor analítico. Já os estudos tipológicos têm trazido um conjunto de dados de diferentes línguas, contribuindo de forma positiva para qualquer disciplina científica. Ambos pautam sua interpretação da mudança por critérios fundamentalmente imanentes. Ambos não passam de continuadores contemporâneos das perspectivas teóricas que excluem da história das línguas os falantes e sua complexa realidade histórico-social.
       Leightfoot (linguista gerativista) tem insistido numa divisão de trabalho nos estudos diacrônicos: à teoria gramatical (lida com a língua), mudanças estruturais e às outras teorias. Reconhecendo a importância dos fatores ambientais, Leightfoot parece delinear uma proposta de futura unificação das teorias que hoje caminham em paralelo.

                                                                                          Leila Gonçalves
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 5: História da nossa disciplina

A história da nossa disciplina II

      Hugo Schuchardt (1842-1927), linguista austríaco que se destacou na crítica aos neogramáticos. Tinha uma concepção subjetivista da língua (o falante individual lhe serve de ponto de referência), mas oponde-se ao conceito de lei fonética, despertou a atenção para a imensa gama de variedades da fala existente numa comunidade e como essas variedades se influenciam mutuamente como as línguas em contato, quer pela proximidade geográfica ou em decorrência de invasões etc. Com isso, abriu-se uma trilha fundamental para os estudos posteriores de linguística histórica, a trilha da dialetologia e, mais recentemente, da sociolinguística.
      Mas foi com Antoine Meillet (1866-1936) que uma concepção mais sociológica do falante e da língua encontrou uma formulação mais consistente e sólida. Para Meillet, a língua é um fato social, sendo assim, as condições sociais passaram a ser vistas como tendo uma influência decisiva sobre a língua e sobre sua mudança. 
      "Tout fait de langue manifeste un fait de civilisation" ("Todo fato de língua manifesta um fato de civilização") (MEILLET, Antoine. Linguistique historique et linguistique générale. v. II. Paris: Klincksieck, 1951. p. 168).
      Essa perspectiva sociológica se encontrava também em William  Whitney (1827-1894), linguista norte-americano e Michel Bréal (1832-1945), linguista francês, mas foi com Meillet, sob a influência do destacado sociólogo francês Émile Durkheim (1858-1917), que essa perspectiva obteve uma formulação mais precisa, também foi aplicada com mais consistência ao estudo empírico. Tinha como objetivo a formulação de uma orientação teórica para o estudo da história linguística que incorporasse a sempre heterogênea realidade sociocultural das línguas. Suas reflexões sobre o léxico indo-europeu motivaram o estudo monumental de Émile Beveniste (1902-1976), seu aluno e sucessor.

      Com Saussure, vem o estruturalismo, cuja proposta era abordar qualquer língua como um sistema no qual cada um dos elementos só pode ser definido pelas relações de equivalência ou de oposição que mantém com os demais elementos. Esse conjunto de relações forma a estrutura, daí o estruturalismo. (Google - estruturalismo)

      Em seu projeto teórico, fixou uma rígida separação metodológica entre o estudo dos estados de língua (sincronia) e o estudo da mudança linguística (diacronia). Também estabeleceu a procedência do estudo sincrônico sobre o diacrônico que foram inspirados nos neogramáticos com quem Saussure estudou em Leipzig. O resultado foi um forte impacto sobre como caminhou a linguística do século XX que se tornou hegemonicamente sincrônica, configurando-se numa maneira estruturalista de pensar a mudança.
      Jakobson foi quem primeiro aplicou o princípio da abordagem sistêmica da diacronia, em seu trabalho "Principes de phonologie historique", publicado em 1931. Ele analisou vários casos de mudança fonológica, procurando mostrar empiricamente o significado dessa perspectiva sistêmica. Jakobson desdobrou o princípio em uma série de perguntas orientadoras da sua aplicação, como: ocorreu uma mudança fônica?O que ela alterou no interior do sistema fonológico? Certas diferenças fonológicas se perderam? Quais? etc.
      Em 1955, André Martinet (1908-1999), desenvolveu extensamente essa perspectiva da dinâmica da mudança. Para ele, há uma pressão de forças contraditórias no sistema da língua que, sob o efeito delas, ocorrem mudanças funcionais ou estruturais. Através de vários estudos e exemplos, Martinet exemplifica conceitos e noções impactantes do estruturalismo.
      A contribuição metodológica do estruturalismo para a linguística histórica, introduziu a exigência de que qualquer mudança deve ser sempre analisada sistematicamente situando-a em suas relações com outros elementos da língua antes, durante ou depois da mudança. O fato dos estruturalistas terem reduzido, na prática, toda a dinâmica da mudança a uma questão exclusivamente imanente, como se a mesma fosse uma realidade totalmente autônoma, é uma crítica que se faz. A realidade da mudança está correlacionada com a estrutura e a história social, exigindo uma abordagem mais realista, é o que apontam os estudos de dialetologia e de sociolinguística.
 
                                                                                                    Leila Gonçalves
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 5: História da nossa disciplina

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

A História da nossa disciplina

A linguística como ciência surgiu aproximadamente 200 anos. Podemos dividir esse período em duas fases: A primeira foi o período da formação e consolidação do método comparatista. E a segunda foi período de duas grandes linhas interpretativas, o estruturalismo, onde surgiram os primeiros neogramáticos, acreditavam nas mudanças da língua com fatores internos (estruturados) e externos (sociais). E a outra o gerativismo, acredita nas mudanças como um acontecimento que se da no interior da língua condicionada por fatores da própria língua.
          A linguística histórica como ciência não nasceu do nada. Há milênios pessoas de diferentes sociedades pensaram a questão da linguagem. Desde o século IV a.C., se tem registro de estudos linguísticos, estudos que começaram com sábios hindus, passaram  pelos filósofos gregos,  pela filologia  dos alexandrinos, pelas gramáticas gregas e latinas entre outros. E ao longo do tempo os textos antigos vêm sendo utilizados para os estudos sobre as mudanças da língua.
          Os primeiros estudos sobre as línguas de civilizações antigas iniciaram em meados do século XVIII por intelectuais europeus. O estudo do sânscrito, língua clássica dos hindus, constatou semelhanças tanto pelas raízes verbais como pelas formas gramaticais, com o latim e o grego. Na sequência destes estudos surgiram várias gramáticas e um dicionário de sânscrito.
O método comparatista
          Os principais teóricos comparatistas foram os alemães Friedrich Schlgel (1829) e Franz Boop (18670). O ponto de partida para a criação do método comparatista foi às pesquisas de Schlegel que em 1808 publicou um texto sobre a língua e a sabedoria dos hindus, nesse texto ele reforçou a tese de W. Jones sobre o parentesco do sânscrito com o latim, o grego, o germânico e o persa, semelhanças nas raízes lexicais e principalmente semelhanças gramaticais.
          Tais semelhanças seriam consequência de uma mesma origem, era preciso comparar as línguas e estabelecer seu parentesco em comum.
          Em 1816 Boop publicou um livro sobre o sistema de conjugação do sânscrito em comparação com o da língua grega, latina, persa e germânica. Essa comparação mostrou de forma detalhada a morfologia de cada língua e as correspondências sistemáticas que havia entre elas. Fundamento para se revelar empiricamente o seu parentesco. Os estudos de Boop não ocorram utilizando dados em ordem cronológica e sim aleatória.
          O método comparatista é um processo central nos estudos da linguística histórica, é por meio dele que se estabelece o parentesco entre as línguas.  Os principais teóricos e fatores que colaboraram para o desenvolvimento desse método foram:
          Jacob Grimm foi o primeiro a estabelecer estudos históricos, de um estágio anterior para outro posterior.
          Grimm interpretou a existência de correspondente fonética sistemáticas entre as línguas como resultado de mutação no tempo. A partir dos estudos de Grimm ficou clara a regularidade dos processos de mudanças linguísticas.
          O linguista dinamarquês Ramus Rask (1832) desenvolveu trabalhos comparativos importantes envolvendo as línguas germânicas, o grego, o latim e o lituano. Esse estudo teve pouca repercussão apesar de metodologicamente exemplar.
          A filologia românica foi muito importante para o desenvolvimento dos estudos históricos – comparativos. Na subfamília românica a documentação em latim e extensa, o que permitiu um importante refinamento metodológico dos estudos históricos.
          August Schleicher (1868) influenciado pelas ideias naturalistas- teoria da evolução, Darwin - formulou uma concepção que tomava a língua como um organismo vivo que nascia se desenvolveria e se extinguiria.
 O surgimento dos neogramáticos
          Na segunda metade do século XIX, surgiu uma nova geração de linguistas, os neogramáticos, relacionados com a Universidade de Leipzig- Alemanha. Eles questionavam certos pressupostos tradicionais da pratica histórico – comparativa.
           Os neogramáticos foram um divisor de águas na linguística histórica.
          Hermann Osthoff (1909) e Karl Brugmann (1919) publicaram em 1878 ”O manifesto neogramático”, nele eles critica a concepção naturalista da língua, que a via como possuindo uma existência independente. Para eles a língua tinha que ser vista ligada ao falante, a língua existia no indivíduo, e as mudanças se originam neles. Defendiam a necessidade de a linguística histórica manter relações estreitas com a psicologia. Interessavam – se em investigar os mecanismos da mudança e não apenas reconstruir estágios remotos da língua. Acreditavam que na língua sempre  se processam transformações, e elas são inevitáveis.
          Em 1880 foi publicado o livro “Princípios fundamentais da história da língua” de Paul Hermann (1921), era uma espécie de manual do pensamento neogramático e foi referência para a afirmação dos diacronistas do século XX. Paul negava a existência de uma linguística que não fosse histórica. Propunha uma diretriz para a mudança     da língua que fosse além da observação dos fatos, deveria expor mais universalmente possível as condições da língua, e que os resultados deveriam ser aplicáveis a todas as línguas. Paul acreditava que os princípios fundamentais da mudança se dava  nos fatores psíquicos e físicos tomados como fatores culturais. Para ele o linguista só precisava de duas ciências a psicologia e a filosofia para aprender a realidade das mutações da língua. A fonte de toda mudança linguística era o falante individual, essa mudança se dava pelo que Paul chamava de ação recíproca dos indivíduos.
A crítica aos neogramáticos
          Desde o início as formulações dos neogramáticos provocaram a crítica de vários linguistas. O centro da polêmica foi o conceito de lei da fonética, compreendida como um princípio imanente de aplicação cega e sem exceções. Os linguistas que se opunham aos neogramáticos não aceitavam o caráter categórico das leis fonéticas, isto é, não aceitavam que as mudanças se espalhassem por toda a comunidade e por todos os itens lexicais de modo totalmente uniforme.
          Se destaca nessa crítica aos neogramáticos o austríaco Hugo Schuchardt (1927), esse linguista ao se opor ao conceito de lei fonética, chamou a atenção para a imensa gama de variedades da fala existentes numa comunidade qualquer, variedades essa condicionadas por fatores como o  sexo, as línguas em contato(quer por invasão, conquistas e intercruzamento étnicos e culturais ou por aproximação geográfica)a idade e o nível de escolaridade do falante. Foi considerando esse quadro heterogêneo que Schuchardt buscou compreender o processo de mudanças das línguas.
                                                                                 Ariana
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 5: História da nossa disciplina. 



A linguística histórica é uma disciplina científica II

     Para alguns iniciantes, juntar todas as teorias seria o caminho mais produtivo, o que não garante uma base produtiva, sendo assim, o cientista abandona esse tipo de teoria por conta da sua complexidade.
     Mostrar duas ou mais teorias diferentes é sempre útil na construção de uma crítica mais abrangente, pois uma teoria levanta questões, análise e aspectos para novos caminhos interpretativos.
    
As teorias Variacionista e Gerativista

     Ambas estudam história da língua, mas com métodos diferentes. Enquanto a Variacionista assume a heterogeneidade sincrônica da língua e correlaciona com contexto social, a Gerativista assume uma realidade homogênea que está ligada a estrutura biológica do cérebro.

Explicação da linguística histórica

     Para a ciência, não é preciso apenas ter registros passivos de seus fenômenos, é também necessário explicá-los, tornar fatos compreensíveis de mostrar como eles se articulam entre si. Para Lass, os acontecimentos da língua são interpretáveis, pois seu estudo busca construir teorias que tornem inteligíveis o que aconteceu, buscando uma racionalidade, uma lógica em sua ocorrência. Cabe, também, a essa teoria, explicitar eventuais restrições estruturais e sociais recorrentes no seu processo de mudança. Para a linguística, não há explicações únicas. Seu estudo também envolve fatores sociais como tem sido mostrado em seus estudos socio-linguísticos.
     O estudo da linguística era entendido de diferentes formas pelos linguistas. Enquanto um estudava o passado para entender o presente, outro estudava o presente para entender o passado. Mas tal estudo desapareceu deixando o método comparativo para estabelecer o parentesco e o passado das línguas.
     O estudo da história da língua é buscar esclarecer o presente com base no que se estudou no passado para explicar de que forma ela surgiu e o que aconteceu para ela ser  o que é nos dias atuais.

Método comparativo

Surgiu no século XIX para tratamento sistêmico às semelhanças entre línguas distantes no espaço como com o latim e o sânscrito. Seu primeiro resultado foi estabelecer o parentesco entre línguas indo-europeias, e o segundo , é o caso das línguas indígenas da América, que não há registros.


Silvânia
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 4: A Linguística história é uma disciplina científica. 



sexta-feira, 8 de novembro de 2013

A linguística histórica é uma disciplina científica

    
     As línguas têm história, constituem uma realidade em constante transformação no tempo. Reconhecido o fato de que as línguas mudam no eixo do tempo, busca-se, então, dar a esse fato um tratamento científico. A lingüística histórica ocupa-se, então, fundamentalmente com as transformações das línguas no tempo e os lingüistas procuram compreender.

     Diversidade teórica

     Como não temos o dom da onisciência, nem o poder de apreensão global instantânea do mundo, nossas aproximações científicas do real são sempre parciais; fazemos recortes nele, construindo nossos objetos de estudo, e formulamos hipóteses explicativas para esses recortes. A ciência não é uma atividade de deuses ou semideuses, mas de pessoas concretas, bem localizadas no tempo e no espaço. Assim, a ciência é uma atividade enraizada na experiência social e histórica dos cientistas. A materialidade dos dados e a reconhecida necessidade de dar fundamentação empírica ás nossas hipóteses introduzem naturais e sempre presentes conflitos entre nossas elaborações teóricas do real. Quem se inicia numa disciplina científica precisa buscar compreender as suas polêmicas, deve também ter como objetivo delas participar, o que significa amadurecer sua capacidade de trabalhar não de forma aleatória, mas dentro de um sistema teórico.

      Sincronia e diacronia

     Entendendo a ciência da linguagem como apenas e necessariamente histórica, Saussure estabeleceu que o estudo lingüístico comportava, na verdade, duas dimensões: uma histórica/diacrônica e outra estática/sincrônica. Na primeira, o centro das atenções são as mudanças por que passa uma língua no tempo; na segunda , são as características da língua vista como um sistema estável num espaço de tempo aparentemente fixo. As mudanças das línguas no tempo, por seu turno, nunca afetam, segundo Saussure, esse sistema globalmente, Saussure chega a dizer , nesse sentido, que o sistema em si mesmo é imutável. Ele entendia que a imobilidade absoluta das línguas não existe de fato e afirmava varias vezes, em seu texto, que as línguas estão em permanente transformação, então o que Saussure fez foi estabelecer como necessária uma rigorosa distinção metodológica entre os dois estudos.

      Linguística descritiva teórica X linguística histórica 
     
     Os manuais de lingüística costumam, então, fazer referência a dois ramos dessa ciência: uma lingüística dita descritiva ou sincrônica e outra histórica ou diacrônica,  mais modernamente os manuais costumam usar a denominação lingüística teórica para os estudos sincrônicos em oposição a lingüística histórica.

     Precedência da sincronia

     Entende-se que, para apontar as transformações ocorridas, por exemplo no português entre os séculos XIII e XX, é preciso comparar diferentes estados da língua, o limite de um estado sincrônico é, na prática, indeterminado, segundo Saussure. Trata-se de uma abstração, cujo critério é o de que o estado sincrônico cubra um espaço de tempo mais ou menos longo, durante o qual a gama de modificações ocorridas seja mínima.

     A hegemonia dos estudos sincrônicos e o questionamento da dicotomia sincronia/diacronia

     A tendência majoritária na lingüística do século XX de privilegiar os estudos sincrônicos, levou boa parte dos lingüistas a manter rigidamente separados os dois estudos. A divisão sincronia/diacronia introduzida por Saussure tem sido também objeto de constantes discussões. Questiona-se, via de regera, a necessidade da separação rígida entre os dois estudos e a própria homogeneização  do objeto, posta por Saussure como necessária para os estudos sincrônicos e assim assumida pela maioria dos estudos posteriores. Weinreich, Labov & Herzog, começam por questionar o pressuposto sincrônico tradicional que associa sistema com homogeneidade, e defende a construção de um modelo de língua que seja capaz de acomodar sistematicamente a heterogeneidade sincrônica. Voloshinov, um dos primeiros críticos de Saussure, já mostrava que a língua, como sistema estável  de formas, é apenas uma abstração científica que pode servir para certos fins teóricos e práticos, mas que não da conta de maneira adequada da realidade concreta e histórica.

     Concepções de linguagem e orientações teóricas diferente

     Ter, pois, clareza quanto á concepção de linguagem de cada orientação teórica é um dos fundamentos para se entender as sua diferenças e, principalmente, para direcionar nossas opções iniciais. Podemos distinguir duas grandes concepções de linguagem , uma a considera como um objeto autônomo, a outra, outro objeto intrinsecamente ligado á realidade social, para a primeira trata-se de observar e determinar seus condicionantes lingüísticos, para segunda é básico acompanhar a histórica social dos falantes. Assim, os que optam por uma visão imanentista têm de enfrentar também as questões socioculturais, da mesma forma , os que optam por uma visão não imanentista têm de enfrentar as questões estruturais. Em razão da diversidade teórica que caracteriza a ciência em cada momento de sua historia e em razão dos respectivos conflitos entre as teorias e entre as teorias e o real, o processo acumulativo se dá menos por somo do que por amplas reelaborações teóricas.

     Selecionando orientações teóricas

     Diante dos termos sincronia/diacronia, não basta apenas entender por alto a que se referem, é preciso antes perceber que essa divisão pressupõe também, na sua origem, uma concepção homogeneizante da língua. Em suma, assumir esta ou aquela concepção de base é que vai determinar nosso método de trabalho, é preciso que o iniciante esteja consciente da complexidade da atividade cientifica e, principalmente, de alguns dos muitos fatores que condicionam nossas preferências teóricas. Assim se temos uma perspectiva mais sociológica e antropológica das realidade humanas, nossa preferência será, certamente, por orientações teóricas que abordam as línguas primordialmente como realidades sociológicas e antropológicas, e se nossa perspectiva porém é mais subjetiva, nossa preferência será, certamente, por uma teoria que aborde as línguas como realidades basicamente psicológicas ou físicas. São exemplos de estudos assim o de Leda Biso que discute a variação das vogais pretônicas no português do Brasil, e o de Marco Antônio de Oliveira que argumenta a favor da segunda hipótese, mostrando que ela permite uma análise mais abrangente dos fatos do passado e do presente.
     Assim, ter claros nossos pressupostos e fundamentos garantem certamente melhores condições para uma maior produtividade cientifica.  mostrando que ela permite uma analise a segunda hipotese ariaçtiviadade cientifica e, principalmente, de alguns dos muitos fal

Ruthe Cassiano 
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 4: A Linguística história é uma disciplina científica. 


quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Características da mudança

      A primeira característica é que a mudança se dá em todas as línguas. É próprio de todas elas passar por transformações no correr do tempo. Dessa maneira, se o português do século XIII era diferente do português de hoje, o português do futuro será diferente do português de hoje: entre eles há um ininterrupto processo de mudança. Se uma língua deixar de ser falada, ela não conhecerá mais, por isso mesmo, mudanças. O desaparecimento de uma língua é resultado do desaparecimento da própria sociedade que a fala. Mas, embora se possa dizer que o latim está há muito extinto, o fluxo histórico nunca se interrompeu: houve um longo, complexo e, principalmente, ininterrupto processo histórico de transformações do latim que resultou nas diferentes línguas românicas.
     O que deve ficar claro, é que se, de um lado, a mudança linguística é contínua, ela é, por outro lado, lenta e gradual, isto é, a mudança nunca se dá abruptamente, do dia para a noite. Há sempre, no processo histórico, períodos de coexistência e concorrência das formas em variação até a vitória de uma língua sobre a outra. Costuma-se justificar a lentidão e a gradualidade da mudança linguística com fundamento na necessidade dos falantes de terem a intercomunicação permanentemente garantida. Mudanças abruptas e repentinas são impossíveis, pois, se ocorressem, destruiriam as próprias bases da interação socioverbal.   
     A história das línguas é dividida em períodos. Estas divisões são cortes arbitrários. Se compararmos os registros do português do século XIII com aqueles do século XVII, por exemplo, notam-se diferenças que justificam, para efeitos de análise, uma divisão da história em períodos.
     Outro aspecto que caracteriza a mudança linguística é a sua regularidade. Observada na mudança linguística, essa regularidade nos permite estabelecer correspondências sistemáticas entre duas ou mais línguas ou entre dois ou mais estágios da mesma língua, tornando assim possível a reconstituição da história. Exemplo: clamare (latim), llamar (espanhol), chamar (português). Deve ficar claro que essa regularidade nunca deve ser entendida como absoluta.
     Estudos empíricos, no presente e no passado, veem sugerindo que fatores sociais têm influência direta ou indireta nos processos de mudança das línguas. Desse modo, não parece adequado tratar a língua como uma realidade autônoma, imune à história de seus falantes. Isso não significa entender a mudança como mecanicamente determinada por mudanças sociais; mas sim, que as mudanças sociais - ao alterar as relações internacionais - podem, por isso, desencadear processos de mudança na língua.
     Os falantes que não conhecem linguística, ao desenvolverem consciência de mudanças em sua língua, tendem, muitas vezes, a desenvolver paralelamente uma atitude negativa em relação a elas, entendendo-as como uma espécie de decadência: a mudança estaria empobrecendo a língua, degenerando-a, transformando-a para pior. Outros, ao contrário, acreditando que mudança significa simplificação, tendem a desenvolver uma atitude positiva diante das mudanças, achando que a língua de hoje, por ser aparentemente mais simples, e portanto, mais "prática", é melhor que a do passado. Hoje, não se entende mudança linguística nem como progresso, nem como degeneração, mas sim como um processo de mudanças graduais e coerentes.
     Concluindo: a mudança é contínua, lenta, gradual (não discreta) e relativamente regular. Ele emerge da realidade heterogênea das línguas, estando, portanto, correlacionada com complexos processos sociais e culturais.

                                                                                                 Hágda 
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 3: As características  da mudança