sexta-feira, 8 de novembro de 2013

A linguística histórica é uma disciplina científica

    
     As línguas têm história, constituem uma realidade em constante transformação no tempo. Reconhecido o fato de que as línguas mudam no eixo do tempo, busca-se, então, dar a esse fato um tratamento científico. A lingüística histórica ocupa-se, então, fundamentalmente com as transformações das línguas no tempo e os lingüistas procuram compreender.

     Diversidade teórica

     Como não temos o dom da onisciência, nem o poder de apreensão global instantânea do mundo, nossas aproximações científicas do real são sempre parciais; fazemos recortes nele, construindo nossos objetos de estudo, e formulamos hipóteses explicativas para esses recortes. A ciência não é uma atividade de deuses ou semideuses, mas de pessoas concretas, bem localizadas no tempo e no espaço. Assim, a ciência é uma atividade enraizada na experiência social e histórica dos cientistas. A materialidade dos dados e a reconhecida necessidade de dar fundamentação empírica ás nossas hipóteses introduzem naturais e sempre presentes conflitos entre nossas elaborações teóricas do real. Quem se inicia numa disciplina científica precisa buscar compreender as suas polêmicas, deve também ter como objetivo delas participar, o que significa amadurecer sua capacidade de trabalhar não de forma aleatória, mas dentro de um sistema teórico.

      Sincronia e diacronia

     Entendendo a ciência da linguagem como apenas e necessariamente histórica, Saussure estabeleceu que o estudo lingüístico comportava, na verdade, duas dimensões: uma histórica/diacrônica e outra estática/sincrônica. Na primeira, o centro das atenções são as mudanças por que passa uma língua no tempo; na segunda , são as características da língua vista como um sistema estável num espaço de tempo aparentemente fixo. As mudanças das línguas no tempo, por seu turno, nunca afetam, segundo Saussure, esse sistema globalmente, Saussure chega a dizer , nesse sentido, que o sistema em si mesmo é imutável. Ele entendia que a imobilidade absoluta das línguas não existe de fato e afirmava varias vezes, em seu texto, que as línguas estão em permanente transformação, então o que Saussure fez foi estabelecer como necessária uma rigorosa distinção metodológica entre os dois estudos.

      Linguística descritiva teórica X linguística histórica 
     
     Os manuais de lingüística costumam, então, fazer referência a dois ramos dessa ciência: uma lingüística dita descritiva ou sincrônica e outra histórica ou diacrônica,  mais modernamente os manuais costumam usar a denominação lingüística teórica para os estudos sincrônicos em oposição a lingüística histórica.

     Precedência da sincronia

     Entende-se que, para apontar as transformações ocorridas, por exemplo no português entre os séculos XIII e XX, é preciso comparar diferentes estados da língua, o limite de um estado sincrônico é, na prática, indeterminado, segundo Saussure. Trata-se de uma abstração, cujo critério é o de que o estado sincrônico cubra um espaço de tempo mais ou menos longo, durante o qual a gama de modificações ocorridas seja mínima.

     A hegemonia dos estudos sincrônicos e o questionamento da dicotomia sincronia/diacronia

     A tendência majoritária na lingüística do século XX de privilegiar os estudos sincrônicos, levou boa parte dos lingüistas a manter rigidamente separados os dois estudos. A divisão sincronia/diacronia introduzida por Saussure tem sido também objeto de constantes discussões. Questiona-se, via de regera, a necessidade da separação rígida entre os dois estudos e a própria homogeneização  do objeto, posta por Saussure como necessária para os estudos sincrônicos e assim assumida pela maioria dos estudos posteriores. Weinreich, Labov & Herzog, começam por questionar o pressuposto sincrônico tradicional que associa sistema com homogeneidade, e defende a construção de um modelo de língua que seja capaz de acomodar sistematicamente a heterogeneidade sincrônica. Voloshinov, um dos primeiros críticos de Saussure, já mostrava que a língua, como sistema estável  de formas, é apenas uma abstração científica que pode servir para certos fins teóricos e práticos, mas que não da conta de maneira adequada da realidade concreta e histórica.

     Concepções de linguagem e orientações teóricas diferente

     Ter, pois, clareza quanto á concepção de linguagem de cada orientação teórica é um dos fundamentos para se entender as sua diferenças e, principalmente, para direcionar nossas opções iniciais. Podemos distinguir duas grandes concepções de linguagem , uma a considera como um objeto autônomo, a outra, outro objeto intrinsecamente ligado á realidade social, para a primeira trata-se de observar e determinar seus condicionantes lingüísticos, para segunda é básico acompanhar a histórica social dos falantes. Assim, os que optam por uma visão imanentista têm de enfrentar também as questões socioculturais, da mesma forma , os que optam por uma visão não imanentista têm de enfrentar as questões estruturais. Em razão da diversidade teórica que caracteriza a ciência em cada momento de sua historia e em razão dos respectivos conflitos entre as teorias e entre as teorias e o real, o processo acumulativo se dá menos por somo do que por amplas reelaborações teóricas.

     Selecionando orientações teóricas

     Diante dos termos sincronia/diacronia, não basta apenas entender por alto a que se referem, é preciso antes perceber que essa divisão pressupõe também, na sua origem, uma concepção homogeneizante da língua. Em suma, assumir esta ou aquela concepção de base é que vai determinar nosso método de trabalho, é preciso que o iniciante esteja consciente da complexidade da atividade cientifica e, principalmente, de alguns dos muitos fatores que condicionam nossas preferências teóricas. Assim se temos uma perspectiva mais sociológica e antropológica das realidade humanas, nossa preferência será, certamente, por orientações teóricas que abordam as línguas primordialmente como realidades sociológicas e antropológicas, e se nossa perspectiva porém é mais subjetiva, nossa preferência será, certamente, por uma teoria que aborde as línguas como realidades basicamente psicológicas ou físicas. São exemplos de estudos assim o de Leda Biso que discute a variação das vogais pretônicas no português do Brasil, e o de Marco Antônio de Oliveira que argumenta a favor da segunda hipótese, mostrando que ela permite uma análise mais abrangente dos fatos do passado e do presente.
     Assim, ter claros nossos pressupostos e fundamentos garantem certamente melhores condições para uma maior produtividade cientifica.  mostrando que ela permite uma analise a segunda hipotese ariaçtiviadade cientifica e, principalmente, de alguns dos muitos fal

Ruthe Cassiano 
Fonte: Faraco, Carlos Alberto - Linguística histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas/ São Paulo: Parábola Editorial, 2005. Capítulo 4: A Linguística história é uma disciplina científica. 


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